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A mente e a liberdade para Skinner
Júlio César de Rose


A mente e a liberdade para Skinner - Júlio César de Rose

    Skinner, o principal psicólogo da corrente behaviorista, é um cientista pouco lido e raramente compreendido. Suas idéias são muito complexas e enfatizam a necessidade de explicar qualquer comportamento, por mais simples que pareça, como resultado da combinação de muitas causas. Os métodos da Análise do Comportamento foram propostos por Skinner para destrinçar estas múltiplas causas e mostrar como elas se combinam para determinar a conduta. Skinner escreveu um livro, "Sobre o Behaviorismo", procurando mostrar que são falsas as afirmações mais difundidas a respeito do seu pensamento, como por exemplo as seguintes: 1)ele ignora a consciência e os estados mentais;

2)formula o comportamento simplesmente como um conjunto de respostas a estímulos, representando assim a pessoa como um autômato, robô, boneco ou máquina;

3)não dá lugar para intenção ou propósito.

   O maior e mais persistente destes erros é considerar que Skinner é um dos teóricos que representam a conduta como uma sucessão de estímulos e respostas. De fato, ele foi o primeiro psicólogo experimental a demonstrar que, mesmos os animais, a maior parte dos comportamentos não são uma reação a estímulos do ambiente. Skinner deu o nome de "operantes" a estes comportamentos, chamando a atenção para o fato de que eles operam sobre o meio. Esta rejeição da teoria do estímulo e resposta está clara na frase que abre o seu livro "O Comportamento Verbal": "Os homens agem sobre o mundo, modificam-no e, por sua vez são modificados pelas consequências de sua ação". Aqui fica delineada uma relação de importância fundamental para o estudo do comportamento: a relação entre o comportamento e os efeitos que este comportamento produz sobre o ambiente. Esta relação estabelece os efeitos ou consequências do comportamento presente como parte das causas do comportamento futuro. Portanto, a vida do indivíduo envolve uma história de relações do seu comportamento com o ambiente; para entender o comportamento é necessário retroagir à história do indivíduo, às relações entre comportamento e consequências ocorridas no seu passado. O comportamento é resultado da história individual, combinada com a herança genética.

    Toda a teoria de Skinner está baseada na noção de que o comportamento de um indivíduo é afetado pelas consequências que comportamentos similares tiveram no passado. Skinner distingue dois tipos de consequências do comportamento. Os reforços fazem com que comportamentos similares ocorram com mais frequência no futuro (este processo é denominado condicionamento operante). Já as punições podem fazer com que comportamentos similiares diminuam no futuro.

    Porém, Skinner sempre chamou a atenção para o fato de que a redução de comportamentos através de punições é ineficaz e costuma trazer graves subprodutos psicológicos. Com base nisto, ele desaconselha enfaticamente o uso de punições na educação ou em qualquer outro campo das atividades humanas.

    Skinner mostrou, por exemplo, como os efeitos do reforço são drasticamente modificados pelo contexto e pelo "tempo" de apresentação do reforço, ou, mais precisamente, pelo esquema de reforço. A análise de casos concretos, sem considerar estas e outras complexidades da história individual, pode resultar apenas em generalizações simplistas.

    Vamos nos referir a um tipo concreto de comportamento, a fala, para dar uma idéia da complexidade da análise e também para introduzir um dos pontos mais controvertidos das teorias de Skinner. Aplicando as noções de reforço e punição poderíamos imaginar, por exemplo, que um indivíduo que fala muito pode ter tido o seu comportamento de falar bastante reforçado no passado; por outro lado, um indivíduo que fala pouco e mostra-se constantemente reservado, taciturno e introvertido, pode ter sido pouco reforçado e/ou frequentemente punido por seu comportamento de falar. Os métodos de análise desenvolvidos por Skinner mostram que raramente as coisas ocorrem de modo tão simples e linear. Por exemplo, reforços ou punições específicas podem fazer com que o indivíduo fale mais na presença de determinadas pessoas e menos na presença de outras; ele pode falar mais sobre certos assuntos e menos sobre outros. Além dos reforços e punições de sua história passada, a fala do indivíduo pode ser afetada pelas suas emoções, motivações, fadiga ou efeito de certas drogas, etc. Para uma análise mais acurada, referir-se simplesmente ao comportamento de falar é muito genérico: é preciso distinguir os diferentes aspectos da fala de uma pessoa, onde podem ser encontrados vários tipos de comportamentos operantes. Há os comportamentos de fazer pedidos, dar ordens, fazer perguntas, descrever diferentes tipos de coisas, ações ou situações etc. E cada um destes tipos de comportamento pode ocorrer nos mais variados contextos, sendo diferencialmente afetado por reforços e punições, além dos demais fatores já mencionados, como emoções, motivações, etc.

    Utilizamos o exemplo da fala, para mencionar a grande polêmica a respeito da aplicação das idéias de Skinner à linguagem. Vários linguistas têm argumentado que os processos de condicionamento operante não podem explicar a estrutura da linguagem humana, e nem a capacidade que um ser humano tem de falar e entender frases que nunca tenha falado ou ouvido antes. Os psicólogos influenciados por Skinner consideram, no entanto, que também na questão da linguagem, como em muitos outros domínios do comportamento humano, há evidências científicas suficientes de que o comportamento presente de um indivíduo é afetado pelas consequências de seu comportamento passado.

    Skinner observou que a linguagem pode exercer um controle direto sobre a ação, modificando os efeitos do condicionamento operante. Ele distingue entre o comportamento moldado pelas contingências (a conduta que é efeito direto e muitas vezes inconsciente dos reforços e punições do passado) e o comportamento governado por regras. As regras podem ser, na verdade, fórmulas, instruções, conselhos, ordens, máximas, etc. Uma pessoa pode receber instruções ou regras formuladas por outros, assim como ela pode, observando seu próprio comportamento e o mundo a seu redor, formular regras para si mesma e através delas dirigir seu comportamento. As regras podem suplantar o efeito direto do condicionamento operante, mas ainda aí cabe à Análise do Comportamento identificar o que faz com que um indivíduo esteja mais ou menos inclinado a seguir regras ou instruções.

    Skinner introduziu a noção de comportamento governado por regras em seu livro "Contingências de Reforço", utilizando-a para analisar os processos de pensamento e solução de problemas. Em outra ocasião ele reafirmou que a Análise do Comportamento "... não rejeita qualquer destes processos mentais superiores; ela tomou a liderança na investigação das contingências sob as quais eles ocorrem. O que ela rejeita é a suposição de que atividades comparáveis têm lugar em um mundo misterioso da mente" ("Sobre o Behaviorismo")

    Em lugar deste mundo misterioso da mente, Skinner fala, em "Sobre o Behaviorismo", do "mundo por debaixo da pele". Ele refere-se à parte do ambiente que está dentro do corpo de cada indivíduo: a pessoa fala para si mesma e executa outros movimentos de seus músculos em escala tão reduzida que não podem ser percebidos por um observador externo. Ela sente dores e as condições de tensão e relaxamento de seus músculos, etc. Só a própria pessoa pode observar ou sentir o que se passa no seu mundo privado. Skinner sustenta que a Psicologia não pode ignorar estes processos só porque eles não podem ser publicamente observados.

    Como o indivíduo pode obter consciência do seu mundo privado, e também do seu comportamento e das condições que o determinam? Skinner sustenta que para isso é necessária a mediação da comunidade, que estabelece as contingêngias de reforço para os comportamentos de autobservação e autodescrição. Como a Análise do Comportamento possibilita um conhecimento das contingências de reforço mais eficazes, Skinner afirma que ela pode ajudar na construção de uma autoconsciência: "Uma ciência do comportamento não ignora, como se diz frequentemente, a consciência. Pelo contrário, ela vai muito além das psicologias mentalistas ao analisar o comportamento autodescritivo. Ela tem sugerido maneiras melhores para ensinar o autoconhecimento e também o autocontrole, que depende do autoconhecimento" ("Contingências do Reforço").

    Subjacente à teoria behaviorista está a idéia de que todo o comportamento humano é determinado, sendo portanto controlado por causas específicas. Ao afirmar as implicações desta causalidade, Skinner é visto como um defensor do controle doo comportamento e um inimigo da liberdade humana. Suas idéias podem, no entanto, ser vistas de uma maneira mais positiva: o homem não pode mudar a natureza e não pode impedir que o ambiente exerça algum tipo de controle sobre seu comportamento. Se ele recusar-se a conhecer os processos que controlam seu comportamento, será sempre uma presa inconsciente das "agências controladoras". Conhecendo os determinantes do comportamento, o homem estaria mais capacitado a assumir o controle do próprio destino.

HERANÇA FILOSÓFICA AINDA ASSOMBRA HUMANISTAS

Fernando de Barros e Silva

    Quando publicou seu primeiro livro "O Comportamento dos Organismos", em 1938, Burrhus Frederic Skinner foi recebido com frieza pela crítica. O livro encalhou; sua segunda edição só saiu na década de 60. No último sábado (18/08/90), Skinner morreu aos 86 anos. Era, então, o maior nome da psicologia behaviorista e um dos pensadores mais controvertidos da segunda metade deste século.

    Skinner foi uma pedra no sapato dos humanistas. Tratou os conceitos de liberdade e dignidade humanas como "mitos" que deveriam ser desconsiderados pela ciência. Entre as acusações que acumulou em vida, estava a de ser um "psicólogo de ratos" e ter concebido uma sociedade nos moldes totalitários. Boa parte da ira que Skinner provocou nasceu do impacto de livros que extrapolavam os limites da psicologia.

    Em "A Tecnologia do Ensino"(1968), o "pai" do behaviorismo radical, como era chamado, lançou a teoria do "ensino programado". Defendia que "máquinas de ensinar" seriam mais eficazes do que professores em sua tarefa pedagógica. Os alunos deveriam ser educados da mesma forma que animais eram induzidos a responder a estímulos determinados dentro do laboratório.

    Skinner já havia ido mais longe em "Walden 2", romance de 1984. O livro descreve uma sociedade imaginária funcionando segundo os postulados behavioristas. Nela, não há classes sociais, propriedade privada, violência ou privilégios. Este mundo, Skinner o imaginava como resultante de condicionamentos complementares. Numa passagem, o autor descreve uma cena em que cabras pastam no jardim de uma casa e tira disso a seguinte conclusão: as cabras ficam alimentadas ao mesmo tempo em que fazem a manutenção do jardim. "Walden" seria um país onde tudo funcionasse dessa forma. Os críticos do "paraíso terrestre" proposto por Skinner diziam que seu preço era a redução dos indivíduos a simples peças de uma "engenharia social" (expressão do próprio Skinner).

    "'Walden 2', foi mal compreendido; o projeto do livro não é totalitário, é movido por um espírito iluminista", diz Maria Amália Andery, 37, professora da faculdade de Psicologia da PUC que acaba de fazer sua tese de doutorado sobre o romance. Segundo ela, as críticas que se pode fazer ao Skinner pensador social são duas: "Sua postura era cientificista; ele acreditava que os problemas humanos poderiam ser resolvidos através da ciência". Além disso, diz Maria Amália, "Skinner não pensa a passagem do mundo atual para a sociedade behaviorista; ele toma isso como um pressuposto, o livro começa pela descrição dessa sociedade".

    No campo da psicologia, a contribuição fundamental de Skinner foi uma invenção à primeira vista banal: uma caixa capaz de isolar animais em laboratório e estudar seu comportamento em condições tidas como ideais. A invenção foi batizada de "caixa de Skinner".

    "Sua caixa é uma espécie de teoria materializada que institui o comportamento como objeto e garante o rigor de seu controle e de sua previsão", diz o professor de filosofia Bento Prado Jr., 53. Para ele, a caixa "também marca os limites da psicologia skinneriana, já que essa não pode abandonar o recinto do laboratório sem se descaracterizar e cair nas noções vagas do senso-comum".

    Bento Prado não está sozinho ao apontar a fragilidade da teoria skinneriana quando esta sai da "caixa". Osmyr Faria Gabb Jr., 40, coordenador do Núcleo de Fundamentos da Psicanálise e da Psicologia da Unicamp, diz que o behaviorismo "foi para o espaço" quando saiu do laboratório. "Quando se debruçou sobre as situações reais de interação social, o skinnerianismo foi desastroso. Na vida não há como controlar as variáveis que se controlam em laboratório", afirma.

    Luis Claudio Figueiredo, 44, professor do instituto de Psicologia da USP, discorda que a teoria de Skinner se esfacele quando enfrenta o mundo. "Ele desenvolveu técnicas de controle e previsão do comportamento que foram fundamentais para o progresso da psicologia e da psicofarmacologia", diz Figueiredo. "O método de Skinner funciona no tratamento de crianças excepcionais e tem aplicações inegáveis na pedagogia", completa.

    Figueiredo distingue duas dimensões na obra skinneriana. Uma é sólida e deriva dos resultados obtidos em laboratório. A segunda foi desenvolvida sem a base experimental e deve ser tomada como "interpretação", não como ciência. "Este é o ponto mais vulnerável de sua obra, mas também o que o tornou conhecido fora da universidade", diz Figueiredo. Segundo ele, Skinner "sabia da fragilidade dessas posições, mas alimentava a polêmica, era um agitador cultural". Se a análise for correta, Skinner atingiu o alvo. Morreu catalizando atenções e provocando polêmicas. 

 

 

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