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Terapia de Casal: retrospectivas
Luc Vandenberghe


Terapia de Casal: retrospectivas - Luc Vandenberghe

 Terapia comportamental de casal: uma retrospectiva da literatura internacional
 Artigo do Professor Luc Vandenberghe da Universidade Católica de Goiás
 

 A literatura da terapia comportamental de casal oferece um arsenal diversificado de técnicas. Porquanto seria impossível oferecer uma revisão geral de todas estas no espaço limitado de um artigo científico, é a intenção do presente trabalho mostrar que esta diversidade não é o resultado de um pragmatismo ateórico, mas abrochou a partir de uma seqüência de grandes visões epistêmicas, cada uma delas oferecendo uma liga paradigmática poderosa o suficiente para transformar uma coleção de técnicas numa abordagem terapêutica coerente.

  As epistemologias às quais o artigo se refere também não são o produto de estudiosos isolados, mas de comunidades em evolução. Para entender isto, deve-se considerar a comunidade dos terapeutas comportamentais como uma cultura, organizada em associações profissionais, encontros, congressos e cursos que permitem entender a terapia comportamental como uma prática cultural. Tem uma linguagem própria, fornecida pela literatura e pela formação. Há nela valores implícitos que têm as suas raízes históricas nas condições enfrentadas pelas comunidades que os produziram. Vista assim, esta cultura necessariamente reflete as tendências da sociedade mais ampla e, por sua vez, ajuda a construí-los. No presente artigo, considera-se a história da terapia comportamental que moldou as práticas de terapia de casal, para, a partir desta compreensão, poder ponderar e apreciar as possibilidades que esta tradição oferece ao terapeuta contemporâneo.

  A terapia comportamental de casal surgiu em países nos quais, durante séculos, uma segregação rígida dos papeis de gênero havia garantindo a homens e mulheres a socialização necessária para se adequar aos seus destinos na família. Quando duas guerras mundiais retiraram, durante anos, grandes números de homens europeus e norte-americanos do mercado de trabalho, abriu-se o espaço para a entrada de mulheres em funções anteriormente fechadas para elas. Junto com o movimento político de emancipação feminina que conheceu seus maiores sucessos na primeira metade do século XX, essa redistribuição do trabalho levou a uma mudança profunda na cultura conjugal. Antes foi, em muitos casos, a miséria que levara mulheres, em contrário às normas sociais, ao mercado de trabalho, e o trabalho delas era marcadamente desvalorizado em comparação com o dos homens. Na segunda metade do século XX, a mulher de classe média tinha uma profissão.

  O cuidado das crianças e do lar não cabia mais a ela, e a autoridade do marido e do pai de família foi questionada na sua essência e profundamente revisada. O fim da segregação de papéis tradicionais tornou imperativa, para os cônjuges, a negociação aberta de suas próprias soluções para as tarefas da vida. Não havia mais respostas evidentes e inquestionáveis. Para viver em casal, os parceiros precisavam agora, mais do que antes, de habilidades de comunicação e de solução de problemas.

Os anos 1950 e 60 eram o palco, principalmente na Inglaterra e nos Estados Unidos, do surgimento da terapia comportamental (Schorr, 1984). Este movimento se encaixava na busca de otimização do funcionamento pessoal, culto que marca a época moderna, dedicada ao racionalismo e à eficácia. Esta busca se encaixava também numa virada da cultura para o individualismo. Nos países onde a terapia de casal emergiu, a mesma época era caracterizada pela celebração de valores como auto-realização e anti-autoritarismo (Rogers, 1961; Leary, 1965). O casamento podia contribuir para a realização pessoal plena dos parceiros, a condição que lhes permitia viver juntos em liberdade individual.
 

O intercâmbio: Análise Aplicada do Comportamento

A primeira geração de terapeutas comportamentais de casal tinha uma formação em Análise Aplicada do Comportamento. Típico nesse modelo é o interesse exclusivo para comportamento publicamente observável e quantificável. Procuraram-se então as causas do comportamento em variáveis ambientais. Para entender o comportamento, devem-se analisar experimentalmente as contingências (Baer, Wolf & Risley, 1968). Aplicadas às relações de casal, cada parceiro estabelece, com seu comportamento, as contingências que controlam o comportamento do outro.

Este movimento explicitamente promoveu, como filosofia da vida em casal, a idéia de que as pessoas investem no relacionamento para crescer como indivíduo. Logo, o bom funcionamento conjugal depende da preponderância de reforçamento positivo nas trocas. Para isso, precisa-se compartilhar tarefas e responsabilidades de forma equilibrada. Problemas surgem quando cônjuges fazem uso excessivo de estratégias de controle aversivo, ou quando os padrões habituais de reforçamento não são recíprocos, assim que um dos dois aproveita da união enquanto o outro é prejudicado por ela (Stuart, 1969; Patterson & Hops, 1972).

Azrin, Naster e Jones (1973) afirmam que uma relação de casal é iniciada pelos parceiros como tentativa de ter acesso a novas fontes de reforçamento. Por isso, há necessidade não só de aumentar a quantidade de reforçamento, mas também de promover mudança contínua e evitar a saciação com um tipo de reforçador repetitivo. Comunicação não é vista como significação lingüística, mas como comportamento modelado pelas contingências interpessoais. Estes autores enfatizam que a qualidade e a interpretação das mensagens trocadas pela díade conjugal dependem das conseqüências dos atos de comunicação. Referem-se ao trabalho de Patterson e Reid (1970) para sustentar a importância de distinguir dois padrões de interação, sendo estes a reciprocidade e a coerção. O primeiro padrão é pautado em reforçamento positivo versus aproximação, e o segundo padrão, em punição versus fuga e em reforço negativo versus esquiva.

Stuart (1969) oferece basicamente a mesma análise. Aponta que estratégias coercitivas são geralmente usadas pelos parceiros para minimizar os aspectos aversivos do comportamento do outro, mas acabam prejudicando o relacionamento. Atração é o resultado da capacidade de influenciar o outro com estratégias positivas. Na sessão, o terapeuta torna explícitos estes aspectos funcionais das trocas entre os parceiros. Ele discute, com o casal, a distribuição do poder em termos de padrões de reciprocidade e de coerção. Poder é definido como a possibilidade de liberar reforços positivos e punições. Ensinar esta análise ao casal possibilita que os parceiros façam uso consciente e consensual das táticas de poder. Podem firmar contratos entre eles, concordando sobre quais comportamentos mereçam quais reforçadores.

As intervenções descritas por este autor visam transformar o relacionamento num melhor ambiente de auto-atualização para os dois indivíduos. Assim, acordos são fechados acerca de trocas controladas, nas quais, por exemplo, o marido se compromete em emitir o comportamento que a mulher deseja, e então ela o retribui com comportamentos especificados no mesmo contrato. Cada um pode realizar os seus desejos, modificando o comportamento do parceiro. Os parceiros aprendem a usar as técnicas da Análise Aplicada do Comportamento na sessão e as aplicam em casa. Uma economia de fichas pode ser usada para reforçar certos comportamentos do parceiro. Acumulando fichas, este último pode, posteriormente, trocá-las para comportamentos do outro que foram estabelecidos no contrato de intercâmbio (Stuart, 1969).

Na sessão, exploram-se os diferentes setores do relacionamento, para detectar as áreas de desequilíbrio. Analisando o setor ‘sair com os filhos’, pode se perceber, por exemplo, que o marido os leva para o cinema e o parque de diversões, enquanto que a mulher os leva para o dentista e às aulas de recuperação escolar. Neste caso, as tarefas precisam ser re-divididas. Na procura de instalar padrões de trocas positivas, a comunicação é essencial. Cada um deve usar sinais claros, que não deixam dúvidas concernindo quais comportamentos serão reforçados. Os parceiros devem aprender a dizer, sem ambigüidade, o que querem do outro para poder abrir mão de estratégias de controle aversivo. A contribuição de cada um precisa ser reconhecida pelo outro. Tudo isto pressupõe que os parceiros adquirem a capacidade de tomar a perspectiva do outro (Stuart, 1969).

Rose (1977) desenvolveu estas idéias na forma de oficinas com grupos de três a cinco casais. Têm como meta ensinar de trocar mensagens positivas, de comunicar de maneira focalizada e específica e de dar e receber feedback. Os métodos são discussões didáticas, modelação pelos terapeutas e dramatizações no grupo. Além disso, a modelagem é necessária tanto para melhorar o desempenho durante uma sessão, quanto para construir uma nova habilidade no decorrer de vários encontros. Comunicação é definida como o processo pelo qual cada parceiro interpreta estímulos que ele ou ela percebe como originando do outro. Embora os parceiros possam tentar transmitir mensagens durante a interação, os terapeutas consideram que a comunicação é o resultado da interpretação criativa dos estímulos. Cada estímulo pode ser interpretado como uma resposta a uma mensagem anterior. Também pode funcionar como estímulo para tentativas subseqüentes por parte do receptor para tentar passar uma resposta para o emitente. Este processo de trocas pode não ser o resultado de intenções conscientes, e é necessariamente influenciado pela história dos parceiros e do contexto em que a comunicação ocorre. A meta do treino de comunicação é aumentar a consistência entre o significado que o ouvinte atribui aos estímulos recebidos e o significado do recado que o outro estava querendo passar. Três características de comunicação efetiva são propostas: consciência da intenção (saber o que é a conseqüência para a qual serve o ato de comunicação – gesto ou fala); abertura para feedback (aceitar que o outro corrija nossa interpretação) e qualidade positiva da comunicação. Esta qualidade é importante porque vai influenciar a facilidade com que o emitente poderá se responsabilizar para sua intenção. A formulação positiva de pedidos de mudança, por exemplo, geralmente torna mais fácil assumir abertamente a responsabilidade pelo seu pedido, como também, de aceitar uma eventual correção e assim melhorar a comunicação.

As oficinas de Rose (1977) começam com a exposição do conceito de comunicação direta. Depois, habilidades básicas descritas por Stuart (1969), como: solicitar uma resposta do ouvinte depois de ter falado; parafrasear o que o outro falou; introduzir momentos planejados que são dedicados exclusivamente à comunicação são propostas para serem aplicadas em casa. Na segunda sessão, é discutido que mensagens ambíguas causam mal-entendidos. A troca de papéis (em que o ouvinte faz o papel do falante repetindo a mensagem) é usada como método de aprender a emitir mensagens claras. Cada participante é instruído a compor uma lista de atividades prazerosas que é deixada à disposição do parceiro, para ser usada no cotidiano, como lista de reforçadores. Usando os itens da lista, o outro pode reforçar determinados comportamentos no repertório de quem fez a lista.

A possibilidade de substituir padrões dolorosos por interações positivas é discutida na próxima sessão e o procedimento de comunicação seletivo (Stuart, 1969) é treinado, em que cada parceiro, antes de tentar encaminhar um recado, se faz perguntas como: “É verdade? Está na hora de falar isto? Será que é construtivo falar isto?”. As mensagens são formuladas de maneira positiva, (visando à interação recíproca) e especifica (para favorecer a clareza). Perguntas questionando “por que” são reformuladas em perguntas questionando “que” e “como”, possibilitando uma comunicação mais objetiva e útil.

A quarta sessão é dedicada à identificação e operacionalização de problemas e conflitos nos relacionamentos dos casais participantes. O maior número possível de soluções alternativas é gerado numa tempestade de idéias. Na seguinte sessão, estas soluções são avaliadas de acordo com as conseqüências a curto e longo prazo. A partir das soluções escolhidas, formulam-se planos de ação nos termos de um contrato entre os parceiros. Nestes, cada parceiro promete emitir um comportamento desejado pelo outro quando o outro cumpre o que foi estipulado, e critérios de avaliação específicos e explicitamente observáveis são formulados.

A segunda metade da quinta sessão é novamente dedicada a exercícios inspirados em habilidades descritos por Stuart (1969): não atender a gestos que contradizem conteúdos verbais (é o que a pessoa fala, que deve ser levado em conta); interpretar estímulos ambíguos sempre positivamente (um sorriso significa felicidade e não sarcasmo); pedir clarificação quando o recado não é de fácil interpretação (a dupla verificação: quem tenta interpretar o recado pergunta se o emitente quis dizer o que entendeu, e o emitente reformula o recado, pedindo ao receptor para resumir com outras palavras o que entendeu desta vez); e tomar a perspectiva do outro (colocar-se no lugar do parceiro, tentando relatar o ponto de vista deste). A seqüência de oficinas termina com uma sessão dedicada à aplicação de tudo o que foi aprendido aos conflitos nos relacionamentos dos participantes.

Foram publicados dados que apoiavam esta abordagem, de acordo com a tradição da Análise Aplicada do Comportamento com sujeito (no caso o casal) como seu próprio controle. Um exemplo típico é o estudo de Hickok e Komechak (1974) com delineamento experimental B-A-B em que a condição A refere à interação normal do casal e a condição B à aplicação de um programa em que a mulher ganhava fichas por participar em relações sexuais com o marido, e este ganhava fichas por olhar o neném enquanto a mulher estava fora da casa. A condição B melhorou consideravelmente o desempenho de ambos, e dados de follow-up dois meses depois do experimento mostraram que a mudança foi mantida.

No auge desse movimento, começaram a aparecer os primeiros estudos de cunho nomotético, que logo depois iam marcar a época cognitiva da terapia de casal. Esta forma de conduzir pesquisa é paradigmaticamente diferente das pesquisas ideográficas aceitas na Análise do Comportamento. Enquanto pesquisas de caso único como as de Hickok e Komechak (1974) apoiaram a eficácia das técnicas, os delineamentos com comparação de grupo nem sempre geraram dados tão otimistas. Jacobson (1977) comparou um grupo de casais tratados com a abordagem de Stuart com um grupo de espera, sem conseguir resultados que mostrassem claramente a eficácia do tratamento. Num novo estudo, Jacobson (1978) comparou (1) um grupo de casais que participaram em procedimentos focados em contratos de intercâmbios específicos, (2) um grupo com contratos holísticos visando, ao invés de comportamentos particulares, a totalidade do estilo de convivência do casal, (3) um grupo de espera e (4) um grupo placebo recebendo atenção do terapeuta sem intervenções específicas. Diferente das pesquisas comportamentalistas, não usou a freqüência de comportamentos como variável independente, mas questionários medindo aspectos do relacionamento. Os dois grupos com contratos se mostraram melhor do que o grupo de espera em medidas de solução de problemas, satisfação conjugal e felicidade com o casamento, mas a abordagem operante tradicional não se destacou como melhor em relação ao que usou os contratos holísticos.

Podemos considerar que a primeira onda de terapia comportamental de casal foi marcada por uma tecnologia de aquisição de habilidades de comunicação objetiva, e pela busca de padrões eficientes de trocas por meio de negociação direta e estabelecimento de acordos concretos. Por se tratar de uma abordagem pautada na Análise Aplicada do Comportamento, restringe-se a comportamentos bem definidos e observáveis. Certos terapeutas de casal (Margolin, Christensen & Weiss, 1975; Jacobson & Margolin, 1979) chegaram a considerar isto uma limitação. Considere o marido que, fazendo como estipulado no contrato que foi firmado na presença do terapeuta, traz o café de manhã da sua esposa na cama. Ela reage com ira: ‘Vai servir café na cama pra seu psicólogo!’ O marido tinha feito o que foi combinado. Ela não deveria ter reagido assim. O que o terapeuta fará quando o casal relata este episódio? Elogiar o marido e incentivar a mulher a ser mais coerente? Independentemente de se a mulher gosta de receber o café na cama, o comportamento do marido pode significar, para ela, que ele está sendo bonzinho, submisso ou sarcástico. Pode significar, ainda, que ele só é capaz de agir quando o terapeuta pede para que ele faça. Ou que ele não quer tomar a iniciativa para agradá-la por própria vontade, mas porque foi solicitado. Ou que ele só faz o que ela pede quando há um acordo que garante algo em troca.

 

A re-significação: Terapia Cognitivo-Comportamental

Os anos 1970 e 80 foram marcados pela ampla divulgação da segunda onda de terapias comportamentais no cenário internacional. Estas tiveram sua repercussão nas práticas da terapia de casal, pela introdução do modelo cognitivo do funcionamento humano. Diferente da Análise Aplicada do Comportamento, a Terapia Cognitivo-Comportamental procura identificar e modificar determinantes psicológicos internos dos problemas.

Processos cognitivos se tornaram alvos de intervenção na terapia de casal. Margolin, Christensen e Weiss (1975) introduziram técnicas provenientes da terapia cognitiva como auxílio no tratamento operante tradicional. Margolin e Weiss (1978) mostraram que esta abordagem eclética aumentou significativamente a eficácia do tratamento. Mesmo assim, fica claro que o modelo cognitivo não tomou o movimento da terapia de casal de assalto. Tratava-se da introdução de táticas clínicas que apenas diversificaram o repertório de terapeutas que continuaram pensando sobre problemas psicológicos em termos de aprendizagem e habilidades.

Jacobson e Margolin (1979) não deixaram de acentuar conceitos inspirados na Análise Aplicada do Comportamento, como a erosão do reforço e a escalação coercitiva. O primeiro se refere à perda do poder reforçador de um evento, por ter sido usado muito freqüentemente pelo parceiro. O segundo é o termo usado para indicar seqüências de interação em que cada parceiro usa estratégias aversivas para mudar o comportamento do outro. Nas intervenções, os autores continuam enfatizando, como Stuart (1969) o enriquecimento do relacionamento, a fim de torná-lo mais reforçador, e o feedback sobre o desempenho de cada parceiro, técnicas estas, que eram centrais na primeira onda. Eles propõem um roteiro de solução de problemas similar ao do Rose (1977) especificando como definir os problemas, incluir o papel do comportamento do reclamante na análise do problema abordado e dicas para ser breve, específico e prático.

Por outro lado, os autores também procuraram inspiração na teoria de aprendizagem sócio-cognitiva de Bandura (1977). Definem os problemas em termos do que os comportamentos significam para os cônjuges (Jacobson & Margolin, 1979; Margolin, 1982). Um homem que trabalha até tarde pode pensar: “Eu trabalho para minha família” enquanto que sua esposa pensa: “Você não me ama”. Na terapia é preciso ressignificar o que está acontecendo e, para isto, as técnicas de reestruturação cognitiva, provenientes das novas terapias cognitivas, eram bem-vindas. Além disso, a nova geração de terapeutas comportamentais de casal trabalha não só com a comunicação direta, mas também com a comunicação indireta e implícita. Não se considera mais esta última um impedimento para o bom funcionamento do casal, mas um canal valioso de expressão e de trocas.

O casal disfuncional agora não é mais caracterizado em termos de déficits de habilidades de comunicação e de solução de problemas, mas pelo grau de reatividade de um parceiro ao comportamento do outro. O termo reatividade se refere a reações extremas de um parceiro a um comportamento do outro que chegou a significar mais do que é objetivamente justificado. A mulher levanta uma sobrancelha, o homem reage com ira quebrando objetos valiosos em casa. Ele demora dez minutos no caminho do trabalho para a casa, e ela o acusa de traição (Jacobson & Margolin, 1979; Margolin, 1982). Marcadores cognitivos de um relacionamento disfuncional são as expectativas negativas sobre o outro e as atribuições disfuncionais feitas a respeito do comportamento dele. Exemplos de cognições truncadas, que influenciam a reatividade acima referida, são: atribuir comportamento positivo sempre a causas situacionais externas à vontade do parceiro, atribuir eventos desagradáveis a características pessoais do parceiro; e atribuir erros do outro à suposta má vontade dele (Jacobson & Margolin, 1979; Margolin, 1987).

Um texto originalmente publicado em 1989 e traduzido em português (Schmaling, Fruzzetti & Jacobson, 1997) mostra Jacobson e seus colegas na sua fase mais cognitivista. Estratégias de solução de problemas concretos e modificação dos padrões de trocas comportamentais, que eram características da primeira onda, continuam fazendo parte da terapia, mas um lugar importante é cedido à reestruturação cognitiva em relação às atribuições irracionais e às expectativas distorcidas.

Similarmente, Baucom e Epstein (1990), na mesma época, destacam entre os processos cognitivos que devem ser abordados na terapia de casal: a percepção seletiva para apenas certos eventos no relacionamento; as atribuições que os parceiros fazem; as crenças fundamentais sobre como relacionamentos funcionam, as crenças sobre si e sobre o parceiro; as normas ou crenças sobre como um relacionamento deve ser; e o que os parceiros esperam do futuro.

Os parceiros aprendem a monitorar o conteúdo de pensamentos automáticos, tanto na sessão (por exemplo, quando o terapeuta interrompe a expressão de emoções por uns minutos para reestruturar uma atribuição irracional) quanto em casa, com o uso do registro diário de pensamentos disfuncionais. Depois de ter percebido que tem pensamentos que contribuem para os problemas, os parceiros e o terapeuta procuram isolar a crença central num dado tipo de circunstância ou conflito. Assim, o casal será capaz de identificar o mesmo tema quando emerge em outras circunstâncias. Uma vez que uma mulher percebeu que tem uma tendência a considerar que seu marido não a acha atraente, pode verificar se realmente existe evidência para apoiar esta crença, e então poderia desafiar seus próprios pensamentos. O terceiro passo consiste em treinar os parceiros a identificar novas distorções cognitivas sem ajuda do terapeuta (Baucom & Epstein, 1990).

As técnicas agora não são somente mais diversificadas, mas também menos lineares do que era o caso na primeira onda. Ao invés de serem ensinados como agir corretamente, os casais recebem instruções às vezes paradoxais. Assim, os parceiros recebem como tarefa de casa, fazer simulações de conflitos ou outros problemas que normalmente ocorrem espontaneamente e que fazem parte do problema. Simulando um problema, ele acaba mudando (Jacobson & Margolin, 1979).

Uma idéia que marca a abordagem é que, numa relação saudável, os parceiros investem na relação sem exigir algo em troca. A ideologia subjacente é bem oposta à aquela da primeira geração de terapeutas comportamentais de casal. Agora o próprio relacionamento é destacado como um valor em si mesmo. A idéia de intercâmbio positivo da primeira onda é mantida, mas numa perspectiva invertida. Agora a pergunta é: “O que posso fazer para melhorar a satisfação do outro no relacionamento comigo?” A iniciativa não vem mais do requerente, mas do doador do comportamento. Cabe agora ao terapeuta organizar tarefas de tal forma que ambos os parceiros possam engajar-se espontaneamente, sem esperar receber algo concreto em troca. Num exercício típico, o doador levanta hipóteses sobre quais comportamentos seriam mais benéficos para o seu parceiro. Depois, ele mesmo pode testar estas hipóteses, aumentando a freqüência dos comportamentos escolhidos, e observar os efeitos que têm sobre a satisfação conjugal do parceiro (Jacobson & Margolin, 1979; Margolin, 1982).

Como foi apontado anteriormente, a terapia de casal cognitivo-comportamental, originalmente, era teoricamente eclética. A cognição não tinha um papel causal privilegiado nas formulações de caso. Os autores mencionados consideraram, dependendo do caso, e dependendo da situação, que processos afetivos ou interpessoais eram mais centrais do que os cognitivos. Aprendizagem em qualquer uma destas três áreas podia ser necessária em determinados pontos da terapia (Margolin, 1987; Baucom & Epstein, 1990), e o papel da emoção podia ser particularmente importante (Jacobson & Margolin, 1979; Margolin & Weinstein, 1983).

Por outro lado, Ellis (1977; 1986) já havia proposto uma abordagem radicalmente cognitiva, de acordo com a qual, os problemas de casal são o resultado de crenças dos parceiros, e por isso estas devem ser modificadas para se obter uma melhora. O autor descreve como as intervenções de confronto da terapia racional emotiva devem ser usados para expor quão irracional são as suposições que fomentam as atitudes de um parceiro em relação ao outro. O impacto dessa publicação sobre a tendência então predominante da terapia de casal cognitivo-comportamental não era grande. A maneira com que Ellis, Sichel, Yeager, DiMattia e DiGiuseppe (1989) depois elaboraram em detalhes a abordagem racional-emotiva para problemas de casal, diferenciou-se principalmente das abordagens ecléticas que dominavam o cenário, pelo seu uso ortodoxo dos preceitos lineares de Ellis concernindo o papel das crenças irracionais na disfunção psicológica. Com isso, um paradigma diferente havia sido introduzido na terapia cognitivo-comportamental de casal. Foi com o livro de Ellis e cols. (1989) e com os trabalhos de Beck (1988), de Dattilio (1989; 1990) e de Dattilio e Padesky (1990), que a visão cognitiva chegou a ser aplicada na sua forma plena na terapia de casal. O modelo cognitivo, trazido por Beck (1988) e Dattilio (1989) da área de terapia individual, permitiu forjar, para cada membro de um casal, uma conceituação de caso. Tornou possível entender os problemas de um casal pela identificação, por trás das brigas e das interações problemáticas, de pensamentos automáticos, distorções cognitivas e crenças fundamentais de cada parceiro. A partir das conceituações cognitivas dos casos, era justificado o uso, no contexto da terapia de casal, de todas as intervenções argumentativas da terapia cognitiva tradicional em coerência com a abordagem que as gerou.

É interessante notar que, apesar da inovação teórica, a abordagem de Beck (1988), Dattilio (1989) e Dattilio e Padesky (1990) em alguns aspectos lembra mais os ideais de Stuart (1969) concernindo à interação adequada em casal, do que a visão de Jacobson e Margolin (1979) ou Beaucom e Epstein (1990). A ênfase torna a ser colocada novamente na promoção de regras claras e racionais. Os terapeutas cognitivos desafiam a comunicação ambígua e indireta e ensinam, aos parceiros, estratégias conversacionais do tipo que encontramos na primeira onda (Stuart, 1969; Rose, 1977). Treino de comunicação e de solução de problemas volta a ser enfatizado (Dattilio & Padesky, 1990). As habilidades propostas para serem aprendidas (Beck, 1988) são fundamentalmente as mesmas como no trabalho de Stuart: expressar pensamentos claramente, escutar e interpretar mensagens, filtrar o que é irrelevante, evitar mandar mensagens contraprodutivas.

Em pesquisas empíricas, a terapia de casal se mostrou eficaz para aproximadamente dois terços dos casais. Deste grupo, outro terço recai dentro de dois anos (Jacobson & Addis, 1993). Estes dados motivaram Jacobson a desbravar outros rumos, identificando-se com mais radicalismo com a Análise Clínica do Comportamento, (um movimento com o qual ela já tinha contato desde meado os anos 1980, quando surgiu, no seio das terapias comportamentais, como uma alternativa behaviorista batizada de ‘Análise Clínica’, para diferenciá-lo da Análise Aplicada). A crítica feita por esse movimento à terapia cognitivo-comportamental era de que a ênfase racional valoriza excessivamente o controle verbal, por meio da disposição de regras, deixando de considerar seus efeitos alienadores (Hayes, 1987; Kohlenberg & Tsai, 1994). De acordo com essa crítica, a socialização ao modelo cognitivo coloca o terapeuta no papel de quem ensina a forma correta de pensar. A ênfase no significado racional e na evidência objetiva não deixa muito espaço para o sentido subjetivo. Os parceiros podem entender e concordar racionalmente que as evidências apóiam uma certa interpretação, enquanto que as coisas têm um outro sentido para eles, já que o sentido subjetivo é o efeito da história idiossincrática do indivíduo que se manifesta no impacto das contingências atuais, e não do raciocínio lógico.

Com a conversão de Jacobson (1991; 1992; 1994) para a Análise Clínica do Comportamento, a terapia de casal de cunho cognitivo-comportamental perdeu um dos seus primeiros líderes, porém não deixou de florescer (p.ex. Dattilio & Epstein, 2003; Dattilio, 2005 a; 2005 b).
 

O sentido subjetivo: Análise Clínica do Comportamento

O indivíduo na era pós-moderna, mais só do que nunca, não é mais sujeito aos grandes mitos consagrados da família ou do casamento. Por outro lado, há o indivíduo massificado, sujeito aos modismos. O superconsumo da terapia de casal faz parte do mesmo fenômeno que o comparável superconsumo da cirurgia plástica como solução de problemas com a imagem de si, ou da terapia individual para não precisar enfrentar de forma ativa o sentido de sua vida. O uso indevido como paliativo desvaloriza a terapia como prática profissional. Tudo isto é parte de uma cultura que promove uma busca alienadora do bem-estar na sua versão mais simplificada e superficial: a esquiva do contato com o mal-estar, a angustia e o vazio. Como reação, nota-se uma nova procura do cerne espiritual da existência, da saúde e do sentido profundo da experiência.

Nas ciências humanas, ergueram-se tendências que minimizaram a ênfase na razão (Gergen, 2001). No seio da terapia comportamental, esta reorientação de valores não se traduziu no desprezo de princípios empiricamente sustentados, mas na reconsideração da subjetividade, tanto do cliente, quanto do terapeuta e até do pesquisador, que antes era considerada como fonte de erro. Uma terceira onda ocorreu, que em continuação com a segunda onda, manteve os sentimentos e pensamentos dos clientes como material importante para se trabalhar. O que foi então a inovação? A terceira geração da terapia comportamental não busca mais, com estratégias diretas, controlar estes conteúdos ou modificá-los.

Jacobson (1991; 1992) situa sua proposta no novo comportamentalismo contextual, que se contrapõe à visão mecânica da primeira onda. Jacobson e Christensen (1996) apontam que aproveitaram as contribuições da então nova safra de terapias comportamentais contextualistas. Destacam a influência que sofreram da noção de ‘aceitação’ nos trabalhos de Linehan (1993) e de Hayes (1987) e a tradução que Kohlenberg e Tsai (1987) fizeram dos conceitos do behaviorismo radical para os processos interpessoais que constituam a relação terapêutica.

O contextualismo considera sentimentos, pensamentos e sensações como dicas das contingências que os geram. O sofrimento psicológico então não é o resultado de um mal-ajustamento da pessoa, mas sinal de que as contingências devem mudar (Jacobson, 1994). Um aspecto interessante dessa visão é que o papel do terapeuta comportamental de casal não pode ser de ajudar os parceiros a se adequar às pautas marcadas da cultura pré-dominante, mas muitas vezes, justamente ir contra as normas e os padrões emocionais e interpessoais, que são resultado da socialização dos gêneros. Esta consideração, que acrescenta, ao papel profissional do terapeuta de casal, um aspecto de ativista político, já foi levantada por Jacobson (1983) e apareceu no primeiro plano na terapia de casal da terceira onda, em que se tomava a serio o desafio de mudar a cultura por meio da terapia (Rabin, Tsai & Kohlenberg, 1996; Jacobson & Christensen, 1996).

Seguindo o que foi enfatizado por Kohlenberg e Tsai (1987) em relação à terapia individual e contrario às práticas dos terapeutas de casal da primeira onda, os terapeutas de casal da terceira onda evitam o uso de reforço arbitrário (Jacobson, 1991; 1992; Jacobson & Christenson, 1996). Contingências artificialmente planejadas (Stewart, 1969) são abandonadas a favor da exploração do comportamento espontâneo. Quando a proximidade física em casa é um problema, falar sobre sentimentos íntimos na sessão pode ser uma forma de proximidade que é funcionalmente equivalente com a primeira. Considerando esta equivalência funcional, o terapeuta pode trabalhar diretamente com o que acontece na sessão ao invés de falar sobre o que ocorre fora da sessão.

Seguindo o que Hayes (1987) já havia apontado para a terapia individual, Jacobson e Christensen (1996) também afirmam que mais do que os problemas com os quais os clientes lidam, as soluções que eles desenvolveram para os mesmos, constituam o real problema. A ocorrência de uma crise do casal muitas vezes mostra que a solução que os parceiros encontraram para seus problemas tornou-se um problema. Seguem exemplos de tais soluções: O marido, para não se sentir culpado ou para evitar brigas, esconde os comportamentos que ela não aprova. A esposa tenta não sentir raiva, quando acha que assim pode salvar seu casamento ou abre mão de seus desejos sexuais porque concluiu que o marido não poderia realizá-los; assim, acaba inviabilizando o relacionamento. A mulher que se sente sozinha em festas obriga o marido ir com ela e sente que isto o afasta mais ainda. Ou ainda, evitar sentir-se rejeitado pode alienar um parceiro tanto de um aspecto real de sua vivência que não será capaz de entender suas próprias reações emocionais.

A idéia principal nesta nova terapia comportamental de casal é que o relacionamento saudável é um fluxo contínuo que inclui tanto aspectos negativos quanto positivos. Quando há mudança positiva, os aspectos negativos do outro e de si mesmo podem ser aceitos. Quando há aceitação, isto já é uma mudança que pode por si mesma acarretar outras. Assim, um jogo dialético de aceitação e mudança está na base do tratamento (Jacobson, 1992; Christensen, Jacobson & Babcock, 1995).

No novo modelo, um relacionamento saudável não é mais caracterizado por ausência de conflitos, mas pela presença de conflitos construtivos e altos níveis de intimidade (Jacobson & Christensen, 1996; Christensen & Jacobson, 2000). Intimidade é definida por Fruzzetti e Iverson (2004) como um padrão de interação em que uma pessoa pode revelar fielmente seus pensamentos, emoções e necessidades e a outra pessoa reage a estas revelações aceitando e validando o que foi expresso. O sentimento que acompanha este tipo de interação é chamado de proximidade (sentir-se próximo do outro). Validação é a expressão de um compreender (e implicitamente ou explicitamente de um reconhecer como legitimo ) da vivência da outra pessoa. Esta validação requer que haja aceitação pelo ouvinte de suas próprias reações emocionais à revelação feita pelo falante, para poder estar atento à revelação (e não distraído pela rejeição das próprias emoções) e aberto para entender a vivência do falante sem julgamento ou racionalização. Mindfulness (Bishop et al, 2004) é o termo usado para descrever este ato de aceitar plenamente de forma consciente e intencional eventos, sentimentos ou pensamentos, com o mínimo de elaboração intelectual ou julgamento. Assim, mindfulness é um elemento chave na construção da intimidade.

As técnicas de aceitação promovem o abandono da luta contra aspectos de si ou do outro que antes eram vistos como causas do problema. Exemplos de técnicas de aceitação são: a união sobre o problema, (os parceiros se permitem entrar plenamente em contato com seu sofrimento sem acusar – defender – atacar ou recuar); transformar o problema em atrativo (ver o que há de positivo nele); promover a expressão de emoções agradáveis; prever problemas futuros como também situações em que o problema não acontece; promover tolerância (e parar de tentar mudar o outro); ênfase no positivo (aprender a elogiar; reforçar comentários positivos, mas agora, em contraste com o trabalho de Stuart (1969), sem desconsiderar o que é negativo); valorizar diferenças (você pode sentir-se bem com o que é diferente em você); planejar recaída (como vamos lidar com ela?); simular problemas em casa (o que era uma técnica de mudança em Jacobson e Margolin (1979), agora é usado para tornar os problemas compreensíveis e aceitaveis); a prática de autocuidados (não perder o que pode dar para si mesmo se o outro não oferece).

Fruzzetti e Iverson (2004) discutem como o desenvolvimento de uma forma relacional de mindfulness contribui no cultivo da aceitação. Quando está com o outro, o parceiro cuida de lembrar do contexto de suas interações como também de seus alvos em longo prazo e seus valores relevantes para o relacionamento. Esforça-se para participar plenamente no momento em que estão juntos, o que torna possível observar e escutar de forma não avaliativa, também em momentos de conflito. Tudo isto permite diferentes maneiras de validar o comportamento do outro. Exemplos de formas de validar que se tornam possíveis por meio do treino de mindfulness são: escutar prestando atenção real sem deixar que a observação seja contaminada pela luta contra suas próprias reações; colocar o observado num contexto mais amplo; refletir com empatia e reconhecer o que está acontecendo com o outro ao invés de focar nos próprios sentimentos e pensamentos a respeito do comportamento do outro; resumir e clarificar a perspectiva do outro; retornar vulnerabilidade com vulnerabilidade; agir de forma a mostrar que a auto-revelação do outro foi compreendida e aceita.

A tomada de perspectiva, habilidade já de destaque na primeira onda, evoluiu em Christensen e Jacobson (2000) para uma prática de distanciamento compreensivo. Os parceiros aprendem enxergar três versões de um evento ou conflito: o seu, a perspectiva do outro, e como um observador neutro poderia vê-lo. A forma em que esta habilidade de tomada de perspectiva é apresentada mostra novamente a influência das práticas de mindfulness e de aceitação que dominam a Análise Clínica do Comportamento (p. ex. Hayes, 1984; 2004). Da mesma forma em que Hayes reconheceu a ligação entre o distanciamento compreensivo e a vivência espiritual, Jacobson e Christensen (1996) afirmaram reconhecer as implicações espirituais da sua nova forma de trabalhar, apesar de que as suas idéias eram baseadas em conceitos puramente seculares.

Tudo isto não significa que a terapia não valoriza mais a mudança. Exigências estritas concernindo à conduta dos parceiros continuam sendo feitas. Violência física, por exemplo, precisa parar antes de a terapia iniciar. As técnicas de mudança complementam as de aceitação. Elas são o legado das duas ondas anteriores. Há o treinamento em solução de problemas, que faz parte do repertório do terapeuta comportamental de casal desde os anos 1960. As trocas controladas por iniciativa do doador e a comunicação implícita também continuam sendo trabalhadas como descrito por Jacobson em sua fase cognitivo-comportamental.

As táticas de mudança são preferidas quando o nível da crise é leve. Quando a emoção negativa está muito intensa, está indicada uma abordagem baseada em aceitação. Quando o compromisso com o relacionamento é grande (muitas coisas unem os parceiros), promove-se, em primeiro lugar, mudança, mas quando a disposição de agir é baixa, a aceitação é mais importante. Quando o problema se define no nível dos comportamentos públicos ou quando se trata de padrões recentes, promove-se a mudança. Quando se trata de comportamentos privados ou padrões antigos e incompatibilidades profundas, trabalha-se com a aceitação (Jacobson & Christensen, 1996).

 

Perspectivas

Esta revisão histórica da terapia comportamental de casal nos levou a reconhecer três ondas independentes. A metáfora da onda faz referência à emergência de conjuntos coerentes de ideias novas que emergiram em momentos determinados, inundaram o campo da terapia comportamental de casal e acabaram por se diluir no mesmo. O uso do termo não sugere que as abordagens agrupadas na primeira e segunda onda devem ser consideradas ultrapassadas. Cada uma das três ondas tem seu próprio futuro. As técnicas da primeira onda podem ser úteis quando os parceiros (ou um deles) não possuem o repertório necessário para poder lidar com o outro e podem adquirir as habilidades necessárias. Também continuam valiosas quando se trabalha com um casal que possui a filosofia pragmática da vida conjugal que esta geração de terapeutas propôs. É valida para parceiros que vêem seu relacionamento como um tipo de sociedade contratual ou para aqueles que, como disse o próprio Stuart (1969), exigem que o outro mude primeiro para que eles mesmos se esforcem a favor do relacionamento. Porém, para muitos outros, os contatos de intercâmbio desconsideram a essência do problema.

O modelo cognitivo parece ser mais indicado para casos em que expectativas rígidas ou interpretações irracionais do comportamento do outro impedem progresso. As técnicas cognitivas são adequadas para casais colaborativos e motivados, que estão dispostos a questionar suas convicções e certezas para a melhora do casamento. Porém, muitos outros casais estão travados em padrões emocionais dos quais eles mesmos compreendem a irracionalidade, mas dos quais não conseguem se desvincular. Finalmente, o uso proveitoso de técnicas cognitivas, na terapia de casal, nunca foi restrito a terapeutas que usam o modelo cognitivo de forma ortodoxa.

As noções de aceitação e de mindfulness, que marcam a terceira onda, são particularmente válidos para casais em que a natureza dos problemas desafia técnicas de mudança. São mais adequadas para casais que precisam achar ou resgatar o sentido do seu casamento. Para outros, porém, tratar-se-á de uma filosofia muito afastada do seu cotidiano.

É claro que a adequação de cada abordagem a um determinado público ou a um determinado conjunto de problemas, não deve permanecer uma questão de intuição clínica. Pesquisa empírica é necessária para verificar ou esclarecer para quem ou para qual caso uma certa maneira de trabalhar é indicada. Neste ponto ainda há muito trabalho a ser feito e o clínico ainda precisa confiar muito em sua própria experiência e suas próprias convicções quando se trata de escolher como se posicionar com um determinado casal.

As abordagens técnicas da terapia comportamental de casal que vieram até nós são resultados de diferentes momentos no processo sócio-histórico mais amplo e também, mais especificamente da evolução da terapia comportamental. São marcadas pelas tentativas desta comunidade verbal profissional de dar sentido às suas práticas, por meio de uma busca de paradigmas coerentes. Além de refletir momentos da história das sociedades que as geraram, estas abordagens, por sua vez, contribuíram para a formação dessas sociedades influenciando a visão que o publico geral, e a categoria de terapeutas em especifico, têm do casamento e dos seus problemas. Assim, nenhuma pode pretender-se superior ou mais verídica que as outras. Porém, esta revisão também pretendeu mostrar que, quando bem compreendias, cada uma das ondas históricas descritas tem sua própria sabedoria e traz um recado importante para nós.


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